Dag Solstad nasceu em 1941, na cidade costeira de Sandefjord. É um dos escritores noruegueses mais conceituados.
À data deste apontamento, Solstad faleceu há cinco meses, com 83 anos; este é o primeiro livro que leio dele.
Gosto de policiais e de mistérios, e a sinopse d’A noite do Professor Andersen descreve um thriller com contornos hitchcockianos, o que me interessaria. Mas não me lembro de alguma vez ter folheado nada deste autor, e não fosse este livro ter sido o mais votado no clube de leitura a que pertenço, não sei se o teria lido.
Mas vamos ao que importa: em Oslo, na noite de consoada, Pal Andersen, professor de literatura especializado na obra de Henrik Ibsen – considerado por alguns críticos como o maior dramaturgo desde Shakespeare; escreveu, entre outras peças, Peer Gynt e Hedda Gabler –, testemunha, da janela do seu apartamento, uma mulher a ser estrangulada no prédio em frente.
O professor, de 55 anos, é divorciado e vive sozinho. Apesar de surpreso, a sua reacção é não fazer nada. Não telefona para a polícia nem comenta o que viu com ninguém.
Os dias passam e o professor sente-se cada vez mais paralisado pela sua indecisão. Retoma os planos de visitar alguns amigos, mas volta sempre ao que assistiu, e à sua apatia.
Este silêncio torna-se o centro do romance. Andersen é inerte, e a espiral de introspecção, culpa e reflexão sobre o sentido da vida e os códigos morais da sociedade moderna, não mudam isso. Ele vê-se como um intelectual moderno: culto, informado, sem coragem para agir.
E quando vê novamente o assassino, num restaurante, surpreende-se como este é um homem banal, "normal".
Para alguns leitores, o autismo social de Pal Andersen será um motivo para abandonar a leitura após alguns capítulos – este é um homem solitário, sem laços afectivos e com amizades superficiais. A escrita foca-se no estado mental do protagonista, e muito menos na acção. E estarmos dentro da cabeça dele resulta numa leitura desconfortável.
A noite do Professor Andersen pode ser lido como um retrato (sombrio) da decadência moral da sociedade moderna.
A escolha deste livro resultou numa discussão apaixonante. Alguns membros do clube interromperam a leitura de vez porque viram o protagonista como alguém desprezível a quem não queriam dar atenção, mas as questões que o livro levanta são valiosas.
«”Tenho de telefonar à polícia”, pensou. Encaminhou-se para o telefone, mas não lhe tocou. “ Foi um homicídio, tenho de ligar à polícia”, pensou, mas continuou a não pegar no aparelho. (…) “Que devo dizer? Que vi um homicídio? Sim, é o que devo dizer. E então vão rir-se de mim e dizer-me para me ir deitar, e voltar a ligar quando estiver sóbrio”(…)»
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(bom)