Autor: Svetlana Alexievich
Género: Não Ficção
Idioma: Português
Páginas: 336
Editora: Elsinore
Ano: 2016
Título original: Chernobylskaya molitva
---
O ano passado, vi Chernobyl, uma série fenomenal da HBO, cujo argumento foi baseado no livro de Svetlana Alexievich. Comprei o livro pouco depois.
Quem nunca ouviu falar de Chernobyl, o desastre nuclear que resultou na formação e difusão de uma nuvem radioactiva que contaminou pessoas, animais e o meio ambiente de uma vasta extensão de terras? O desastre ocorrido em 1986, na fronteira da Ucrânia com a Bielorússia, que os Russos tentaram ocultar, o mais possível, dos Europeus?
Vozes de Chernobyl: história de um desastre nuclear foi uma leitura lenta. É um livro intenso, com passagens muito difíceis.
«A morte é a coisa mais justa do mundo.»
E isto porque nesta recolha de testemunhos por parte da escritora e jornalista, feita ao longo de três anos, ouvimos vozes de bombeiros, soldados, caçadores, pilotos de helicópteros, profissionais de saúde, burocratas, viúvas e mães de crianças com defeitos à nascença. Narram episódios de heroísmo, perda, tristeza e incompetência. Pelo meio, a autora relata as pausas no discurso: [ri], [começa a chorar], [pára de falar].
Limpezas, rondas, evacuações e outros serviços feitos sem equipamentos de protecção, por humanos muitas vezes a fazer o trabalho de máquinas que avariaram devido à radiação intensa.
«Disseram a todos nós a mesma coisa: é-nos impossível dar-vos os corpos dos vossos maridos, dos vossos filhos, estão em estado muito radioativo e vão ser enterrados num cemitério de Moscovo, de forma especial. Em urnas de zinco seladas, debaixo de lajes de cimento. E vocês têm de assinar este documento. É preciso o vosso consentimento. (...) os mortos, como bem viam, eram agora heróis e já não pertenciam às suas famílias. Já eram figuras do Estado... Pertenciam ao Estado.»
São os detalhes pessoais que nos tocam fundo: os contratados para abaterem animais de estimação abandonados no seguimento de evacuações forçadas; daqueles que recusaram abandonar as suas casas em terreno contaminado; dos homens que limparam a zona do reactor sem serem informados dos riscos. Todos eles faziam parte do tecido social da época, soviéticos até ao tutano e selectivamente (in)formados pelo partido.
O que estas pessoas passaram é indescritível e a autora consegue dar-lhes voz, e fá-lo de uma forma bela e simples, sem lhes beliscar a dignidade nem suavizar o que é dito.
Svetlana Alexievich foi galardoada com o Nobel da Literatura em 2015 «pela sua escrita polifónica, monumento ao sofrimento e à coragem na nossa época».
******
(fenomenal)