domingo, março 29, 2020

O homem de giz


Autor: C.J. Tudor
Género: Mistério
Idioma: Português
Páginas: 273
Editora: Planeta (e-book)
Ano: 2018
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Depois de ter visto o livro destacado em várias livrarias (ainda) e mencionado em diversos posts, finalmente cedi. 

Mergulhei, então, no primeiro livro de C.J. Tudor, lançado no início de 2018.

Em 1986, um grupo de miúdos descobre um cadáver na floresta, depois de seguir uma série de desenhos feitos em giz. É um episódio que os vai marcar profudamente e à cidade onde vivem.

Um desses miúdos, Ed, é o narrador.
Em 2016, esforça-se por ultrapassar coisas que aconteceram no passado. É um tipo com alguns tiques e que gosta do seu copito mas é pacato. Um dia, ele e os amigos de infância recebem o desenho de um homem de giz enforcado. Quando um dos amigos aparece morto, Ed sabe que tem de revisitar o que aconteceu há três décadas.

É evidente a admiração da autora por Stephen King, citado por ela como uma grande influência, o que se nota em alguns pontos da história, com alguns pormenores que lembram The Body, adaptada ao cinema (Stand by me). Não me admirava de o ver também adaptado ao cinema.

A vibe dos anos 80 é um ponto positivo e o recurso aos cliffhangers no final da maioria dos capítulos resulta algumas vezes, depois perde charme.  

O homem de giz é bem executado mas ficou aquém do que esperava.

***
(mediano/razoável)

terça-feira, março 24, 2020

Horrorstör


Autores: Grady Hendrix, 
Michael Rogalski (ilustrador)
Género: Terror
Idioma: Inglês
Páginas: 240
Editora: Quirk Books (e-book)
Ano: 2014
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Este é o segundo livro que leio de Grady Hendrix, depois do excelente We sold our souls.

Em Horrorstör, Hendrix debruça-se sobre o sector do retalho. O livro em papel, concebido para ter a aparência de um catálogo do IKEA, é genial, com cada capítulo ilustrado por um produto disponível na loja ORSK - uma cópia fictícia do gigante IKEA -, cenário da acção. Eu li o e-book, que não é tão fixe, mas que ainda assim resulta bem graficamente.


Algo estranho está acontecer na ORSK do Ohio. Ultimamente, a equipa que abre a loja descobre estantes Kjërring desmontadas, dejectos nos sofás Brooka e copos estilhaçados. Como as câmaras de vigilância não mostram nada de anormal, um grupo de funcionários decide ficar depois do fecho.
«Work gives you a goal. It lets you build something that lives on after you’re gone. Work has a purpose beyond making money.»
À noite, na escuridão, o interior da loja é labiríntico, os barulhos e estalidos multiplicam-se. O showroom, projectado para forçar os clientes a moverem-se no sentido anti-horário, presos num frenesim de consumismo durante o dia, é o palco de algumas entidades sombrias quando cai a noite.

Horrorstör é um romance à parte. Por detrás do grafismo inovador, está uma crítica da sociedade de consumo extrema e uma sátira da filosofia corporativa, tudo misturado num romance horripilante.

****
(bom)

quinta-feira, março 19, 2020

O marinheiro que perdeu as graças do mar


Autor: Yukio Mishima
Género: Romance
Idioma: Português
Páginas: 176
Editora: Assírio e Alvim
Ano: 2008
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Este é o primeiro livro que leio de Mishima, pseudónimo de Kimitake Hiraoka, nascido em Tóquio em 1925.

Mishima suicidou-se aos 45 anos por seppuku (vulgo haraquíri), seguindo o código de conduta dos samurai, por ideologia e por não se rever na direcção que a sociedade japonesa estaria a tomar - não terá ajudado uma tentativa de golpe de estado que lhe valeu enorme contestação.

Em O marinheiro que perdeu as graças do mar, o adolescente Noboru está fascinado com a relação amorosa da mãe com Ryuji, um marinheiro que carrega a grandeza do mar e uma aura de masculinidade impossível de ignorar. Noboru não é próximo da mãe, não tem uma figura paternal na sua vida e faz parte de um grupo de rapazes com tendências violentas. A presença de Ryuji vai agitar e mudar várias coisas.
«A glória, como vós sabeis, é uma coisa amarga.»
Há partes do livro viscerais, outras de grande beleza evocativa. É raro encontrar um autor assim; uma cena particular envolvendo um gato é aflitivamente descritiva, mas a descrição é ao pormenor, tornando-a impossível de esquecer. É um livro muito denso.

Li que Mishima foi várias vezes indicado como candidato ao Nobel da Literatura, e consigo ver o porquê. Há força na sua escrita e a leitura não é fácil - as personagens d'O marinheiro que perdeu as graças do mar marcaram-me ao ponto de não querer voltar ao universo do autor tão cedo. 

****
(bom)

domingo, março 15, 2020

The choice


Autor: Dr. Edith Eger
Género: True crime
Idioma: Inglês
Duração: 12h e 26m
Editora: Simon & Schuster (Audible)
Ano: 2017
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The choice é uma biografia escrita por uma sobrevivente do Holocausto.

No início dos anos 40, Edith era uma adolescente húngara que vivia para a dança e para a ginástica; fazia parte da equipa nacional de ginástica até ter sido expulsa devido ao clima crescente de anti-semitismo. É o golpe mais devastador da sua vida até eclodir a segunda grande guerra, quando a família Eger é intimada a embarcar em vagões…

No campo de Auschwitz Edith sofre várias atrocidades, testemunha muitas outras e dança para o infame Mengele. No final da guerra, órfã, com pouco mais de trinta quilos e muito debilitada, não sabe o que fazer com a liberdade recém-adquirida. O seu relato de sobrevivência é tocante e um milagre.

«No one can take away from you what you’ve put in your mind.»
 
Edith sobreviveu a Auschwitz, casou, teve filhos, mudou-se para a América e formou-se em psicóloga clínica - é mundialmente conhecida pelo seu trabalho no tratamento da perturbação de stress pós-traumático (PSPT). Com mais de 90 anos, ainda dá consultas, determinada a ajudar outros a encontrarem a paz que ela própria demorou décadas a encontrar.
 
Edith Eger não é a primeira sobrevivente de Auschwitz a relatar a sua experiência mas a sua perspectiva e o seu percurso são singulares; profissionalmente, a relação com os seus pacientes é feita com uma profunda empatia e humildade, e o seu entendimento da dor e do perdão é único.  
 
The Choice é triunfal.
*****
(muito bom)

domingo, março 08, 2020

Viral


Autor: Helen Fitzgerald
Género: Romance
Idioma: Inglês
Páginas: 272
Editora: Faber & Faber
Ano: 2016
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Su é uma jovem responsável, boa aluna, prestes a entrar em Medicina; adoptada na Coreia do Sul por um casal anglófono quando tinha meses, sabe que escapou a uma existência triste num orfanato. A irmã, Leah, da mesma idade, não está preocupada em ter uma carreira ou um emprego; quer divertir-se o mais possível enquanto os pais lhe pagarem as despesas.


Leah, determinada que Su não passe o Verão enfiada em casa, lança a ideia de fazerem uma viagem de finalistas a Magaluf, em Maiorca, com duas amigas. Su aceita.

No último dia de férias, depois de uma noite com muito álcool, Su acorda com um link para um vídeo que se está a tornar viral: nele, aparece a fazer sexo oral a doze homens num bar, completamente embriagada. A irmã e as amigas aplaudem, rodeadas por estranhos.

«So far, twenty-three thousand and ninety-six people have seen me online. They include my mother, my father, my little sister, my grandmother, my other grandmother, my grandfather, my boss, my sixth year biology teacher and my boyfriend James.»

A cada minuto que passa, a cada partilha que é feita, mais pessoas no mundo descobrem o que Su fez nas férias. O efeito cascata rapidamente se faz sentir e ninguém ligado a Su escapa. Na Escócia, a mãe das jovens, juíza de primeira instância, vê-se impossibilitada de iniciar uma acção judicial contra o autor do vídeo, e pondera fazer justiça pelas próprias mãos. Uma após outra, sucedem-se catástrofes que vão alterar a vida de Su e da sua família para sempre.

A cada capítulo, vemos o impacto das redes sociais e o seu poder. Vemos como Su e a família tentam lidar com o sucedido, as reacções de amigos e conhecidos, a forma como tudo é noticiado.

Uma pesquisa rápida no Google mostou-me que situações similares são comuns e estão disponíveis online. O que para algumas pessoas será impensável é o esperado (e procurado) por milhares de jovens que todos os anos se deslocam à ilha para desfrutar das praias e da vida nocturna.

As personagens são credíveis, o livro simples e com uma mensagem muito poderosa. Viral aborda um assunto difícil de uma forma realista; no fim fica a sensação que ficou tudo "arrumadinho" muito depressa mas isso não prejudica o ritmo de leitura. O essencial ficou escrito. 

****
(bom)

domingo, março 01, 2020

Sour candy

 
Autor: Kealan Patrick Burke
Género: Terror
Idioma: Inglês
Páginas: 67
Editora: Amazon (Kindle)
Ano: 2015
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Phil Pendleton está feliz e sente que a vida não lhe poderia correr melhor. Numa passagem por um Walmart para comprar uns doces para passar o dia a ver filmes enroscado com a namorada, presencia uma cena perturbante: uma criança em plena birra e uma mãe apática, incapaz de controlar o petiz, enquanto as pessoas em volta tentam não julgar muito... sem sucesso.

Momentos mais tarde, fora do supermercado, Phil é protagonista de uma cena que vai virar-lhe a vida do avesso. O miúdo que há pouco chorava não o perde de vista e chama-o de pai, e não há nada que Phil possa dizer que convença as pessoas à sua volta que isso não é verdade. Parece um episódio à "Twilight Zone".

«Four months to the day he first encountered the boy at Walmart, the last of Phil Pendleton's teeth fell out.»
Toda a gente parece crer que a criança lhe pertence, e a própria garante que são uma família e que sempre viveram juntos. Seguem-se semanas de terror, onde Phil questiona se terá perdido a sanidade... 
 
Sour Candy é uma leitura rápida e intensa, e deliciosamente bizarra. Kealan Patrick Burke transmite com mestria a inquietação e desespero de Phil, e todo o ambiente de tensão.
 

A reviravolta final é bem imaginada e surpreendente. Sendo um conto de pouco mais de 60 páginas, fiquei com pena de não ver desenvolvidos alguns aspectos porque acho que havia potencial para isso.

Um autor recém descoberto que fiquei com curiosidade em seguir.

****
(bom)