segunda-feira, junho 27, 2022

O romancista ingénuo e o sentimental

 

Autor: Orhan Pamuk
Género: Não Ficção

Idioma: Português

Páginas: 144

Editora: Editorial Presença

Ano: 2012
Título original:
Saf ve düşünceli romancı 

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Orhan Pamuk, nascido em Istambul, é um escritor e professor de Literatura. Recebeu em 2006 a mais alta distinção na área - o Nobel -, a que se junta(ra)m numerosos prémios e distinções literárias. A sua obra está traduzida em mais de cinquenta línguas.

Tenho alguns livros do escritor na minha lista, mas foi este, um dos poucos títulos de não ficção que escreveu, o primeiro que li.

O romancista ingénuo e o sentimental nasceu de um convite a Pamuk, da parte da Universidade de Harvard, para falar sobre a arte de escrever. O resultado dessas palestras seria depois condensado neste livro, seis capítulos em que o laureado fala sobre o que se passa quando lemos romances, a transição para o mister de escritor, e como ambos co-existem.

«Os romances são vidas segundas, vidas paralelas às nossas. (...) O que se passa na nossa cabeça, na nossa alma, quando estamos a ler um romance? Em que medida essas sensações interiores diferem de quando estamos a assistir a um filme, a ver um quadro ou a ouvir um poema, mesmo que seja um poema épico? Um romance pode, de vez em quando, dar-nos o mesmo prazer que uma biografia, um filme, um poema, um quadro ou um conto de fadas. No entanto, o efeito verdadeiro único da arte do romance é fundamentalmente diferente do efeito provocado por outros géneros literários, por um filme ou um quadro.»

Pamuk partiu de duas classificações do poeta e filósofo Friedrich Schiller para classificar os poetas: os ingénuos - os que escrevem espontaneamente, sem implicações intelectuais ou éticas, ao sabor do momento e animados por algo maior ligado à Natureza, a Deus, ao Universo - e os sentimentais - os que escrevem  conscientes de métricas e estruturas, refinando métodos e ideias, sabendo o que querem transmitir desde o início. 

Depois faz o seu próprio comentário a esta distinção, aplicando-o aos romancistas, partindo da sua experiência como leitor, depois como um escritor, analisando como as duas partes se complementam. O resultado é um livro cativante, escrito por alguém claramente apaixonado por livros.

Pelo meio, Pamuk fala ainda sobre a sua paixão pela pintura, como a complementa com o seu amor pela escrita - «pintando palavras» quando escreve -; analisa algumas passagens de Anna Karénina (Tolstoi), «um dos mais perfeitos romances alguma vez escritos», e remata comentando sobre a importância do "centro", ou o coração, da história.

Não é um livro consensual pois somos leitores (e, alguns de nós, escritores) de formas diferentes, mas cativa pelo entusiasmo com que Pamuk relata a sua experiência como ambos, e comenta sobre as passagens de alguns dos seus livros favoritos a partir dessas mesmas perspectivas.

O romancista ingénuo e o sentimental é um livro sobre livros. Para quem gosta de ler, haverão poucos temas mais interessantes. No fim, pouco importam as diferenças entre escritores ingénuos e sentimentais, que serve como ponto de partida para uma reflexão mais rica e profunda sobre a literatura. 

*****
(muito bom)

domingo, junho 19, 2022

The tiger came to the mountains (Trespass #1)

 

Autor: Silvia Moreno-Garcia
Género: Conto
Idioma: Inglês
Páginas: 28
Editora: Amazon Original Stories (Kindle)
 Ano: 2022

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A chancela Amazon Original Stories lançou uma colecção de contos intitulada "Trespass", disponíveis em e-book e em audiolivro.

A intenção do organizador da colecção, Jeff VanderMeer, foi o de juntar histórias diversas, «que vão do terror ao realismo mágico», escritas por autores bestsellers: Silvia Moreno-Garcia, Stephen Graham Jones, Carmen Maria Machado, Tochi Onyebuchi, Karen Russell e o próprio VanderMeer.

As seis histórias da colecção exploram a relação do Homem com a Natureza, os conflitos que daí advêm e as suas consequências. Cada conto é vendido em separado; para quem tem Amazon Prime, os e-books são gratuitos. 

Comecei pelo primeiro conto: The tiger came to the mountains, de Silvia Moreno-Garcia.

Desta autora, li Mexican gothic, que recomendo, lançado em 2020 e vencedor do August Derleth Award de melhor livro de terror, em 2021

Em The tiger came to the mountains, a acção passa-se em 1917, durante a Revolução Mexicana. A nossa narradora é uma destemida jovem de 13 anos, que a autora baseou numa bisavó que sobreviveu ao conflito armado.

Em menos de trinta páginas, somos imersos no ambiente de medo e privação em que as personagens vivem. O evento central é o título do conto, mas é a luta humana pela sobrevivência durante a guerra o drama central.

Ninguém está a salvo dos soldados que pilham, e agridem, e assassinam. Por isso, quando alguns animais selvagens escapam de um circo, é mais uma história engraçada do que algo que inspire um receio real. Sobreviver à guerra é muito mais importante... e improvável.

O encontro entre o tigre e a protagonista é o ponto alto, mas não o mais intenso. A narradora é precoce, teve de crescer depressa, tem responsabilidades e medos que ninguém tão novo deveria ter. A sua família é formada por mulheres fortes, que têm de gerir os aspectos práticos e cuidar dos membros mais sensíveis, simplesmente porque alguém tem de o fazer.

Moreno-Garcia é uma escritora talentosa que sabe envolver o leitor. A narrativa tem vários aspectos simbólicos e momentos de beleza poética.

«My father had taught me enough about the art of taxidermy. (...) I stuffed what the boys brought me. Except for the rabbits, which I would catch in a snare, and the squirrels, which I killed with my slingshot. I know some softhearted people might think it is cruel to kill a squirrel, but it's crueler still to watch your siblings growing up stunted and skinny. A squirrel's tiny bones may be hard to pick when you are having soup, but hunger is harder.»

Estou entusiasmada em ler os restantes títulos.

O próximo número da colecção é Wildlife, de Jeff VanderMeer.

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(bom)

domingo, junho 12, 2022

Seis anos depois

  

Autor: Harlan Coben
Género: Thriller, Mistério

Idioma: Português

Páginas: 288

Editora: Editorial Presença

Ano: 2013
Título original:
Six years 

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Já li alguns livros de Harlan Coben. Escrevi um apontamento sobre o Não contes a ninguém aqui no blog; é um dos escritores a considerar quando quero ler um thriller, um género prolífico com milhares de novos títulos (e várias reedições de bestsellers) a saírem todos os anos.
 
Recentemente, li o Seis anos depois.
 
A sinopse do livro: passaram-se seis anos desde que Jake Fisher assistiu ao casamento do amor da sua vida com outro homem. Durante esse período, ele cumpriu a promessa de não voltar a contactar Natalie, mas quando lê o obituário do marido dela, não consegue impedir-se de ir ao funeral. 
 
... Acontece que a viúva não é Natalie, mas outra mulher que Jake nunca viu. Começa então uma busca pela verdade e por Natalie, por quem Jake continua apaixonado
 
Sendo este livro um thriller, não vai ser uma tarefa fácil para o protagonista.
 
Jake é solteiro e reservado, um professor de Ciência Política com uma vida pacata. Descobrimos o que o faz largar tudo para se envolver nas sucessivas situações incríveis que lhe acontecem quando decide encontrar Natalie, persistindo em averiguar o paradeiro de alguém com quem esteve envolvido um par de meses há mais de meia década. O livro é contado na primeira pessoa, com várias considerações pessoais e tiradas humorísticas a que nos vamos habituando.

As partes menos boas passam pelo "elenco de apoio" (o melhor amigo, a colega com contactos úteis, os vilões), todas figuras que nos habituámos a ver nos filmes de acção, que dizem e agem como esperado. Não é dramático. Há ainda uns quantos capítulos a meio que se tornam repetitivos e se arrastam, e a inclusão dos mesmos quebrou o ritmo da narrativa durante umas dezenas de páginas.

No fim, a trama intrigante compensou, assim como a mistura de situações onde várias pessoas mentem e manipulam e desorientam o protagonista. Tudo muito bem executado, pois Harlan Coben tem mais do que provas dadas e muitos prémios literários neste género: chapeau.

 
Seis anos depois foi uma boa escolha para um período de férias: um mistério com bom ritmo e várias reviravoltas que nos entretêm e mantêm o suspense. Recomendado

****
(bom)