A história d'O Aloendro Branco é forte, tocante e inesquecível, com uma galeria de personagens femininas carismáticas e muito fortes.
A nossa narradora é Astrid Magnussen, uma
adolescente cuja vida gira à volta da mãe, Ingrid, uma mulher de temperamento artístico e caprichoso, com tanto de peculiar como de egoísta.
Ingrid e Astrid vivem no seu próprio mundo, onde Ingrid dita as regras: é rainha e senhora. Agressiva e apologista dos valores vikings, que apelida orgulhosamente de antepassados, Ingrid despreza os "sentimentos menores", como a compaixão e o amor, fazendo crer a Astrid,
através de uma visão romântica típica do seu espírito de poetisa, que
apenas precisam uma da outra para sobreviver.
Até ao dia em que Ingrid,
habituada a relações fugazes e dominadas por ela, se apaixona por um homem e inicia uma relação séria. Quando ele decide acabar, Ingrid só pensa no seu orgulho ferido e encara-o como um alvo a abater. Premeditada e friamente, envenena-o com o belo e delicado aloendro que cresce no jardim da casa onde vive com a filha. Quando é presa, julgada e
condenada a prisão perpétua, Ingrid encara a situação como inevitável mas justificada. O futuro de Astrid, com 12 anos e a vida
virada do avesso, é a última coisa a passar-lhe pela cabeça.
«Nunca
tenhas esperança de encontrar pessoas que te compreendam (...). Pessoas
inteligentes, sensíveis, são excepção, uma rara excepção. Se estiveres à
espera de encontrar pessoas que te compreendam, a desilusão tornar-te-à
cada vez mais sanguinária. O melhor que podes fazer é compreender-te a
ti própria, saber o que queres, e fazer com que a manada não se
interponha no caminho.»
Entregue aos cuidados do Estado e das assistentes sociais, Astrid passa por várias famílias de acolhimento, sobrevivendo a agressões, negligência e inúmeros actos de violência. A mãe, da prisão, exerce sobre
Astrid todo o tipo de pressões psicológicas, esforçando-se por manter a influência sobre a filha e tentar que permaneça intocável aos que a rodeiam.
Mas Astrid está decidida a ser uma pessoa melhor, a conhecer o afecto que a mãe sempre lhe negou e a auto descobrir-se. Sobrevive cada dia graças à sua crescente sensibilidade, inteligência e talento artístico, refugiando-se no desenho e na pintura.
Pela sua vida vão passando várias mulheres: mulheres que Astrid ama ou odeia, mas todas lhe ensinam algo e deixam a sua marca na vida da jovem. Sem poder, a mãe sociopata vai adaptando o seu discurso para atrair a filha, mas Astrid vai percebendo cada vez melhor a mãe e as suas motivações, percebendo que dos pais recebemos benções mas também maldições, e o que Ingrid lhe incutiu nos anos que partilharam - força, gosto pelo conhecimento, independência, coragem -, é o que as vai afastar, pois são as características que permitem à nossa narradora sobreviver num mundo cruel que não se sente pena de orfãs.
«O
passado é uma chatice (...) Não acumules passado, Astrid. Não veneres
nada. Queima tudo. O artista é como a fénix que renasce das cinzas.»
O Aloendro Branco é impossível de pousar, o mais recente page turner que me passou pelas mãos, onde as 400 e muitas páginas formam uma história magnética, com momentos líricos memoráveis e uma narradora de essência rara.
NOTA: Devido ao sucesso do livro, Hollywood fez a adaptação do mesmo ao grande ecrã, que resultou num filme interessante que já comentei no bué de fitas (e cuja capa, acima, é a usada para comercializar o título em Portugal).
avaliação: ***** (muito bom)