29 de agosto de 2022

Lançamento do livro 'Sangue', conversa com os autores e autógrafos - Feiras do Livro de Lisboa e do Porto

Olá caros leitores!

Espero que tenham tido umas excelentes férias!

Já tinha partilhado convosco que vou ser publicada pela segunda vez; o meu conto "Sob a névoa" vai integrar a antologia Sangue, das Edições Trebaruna. 💛

Já há datas para o lançamento/apresentação nas Feiras do Livro de Lisboa e do Porto, em dois eventos que incluirão uma conversa com os autores e sessão de autógrafos.

Eu vou estar nos dois eventos, por isso, se passarem por lá, não se acanhem. Venham dizer um olá!

Feira do Livro de Lisboa - Parque Eduardo VII
3 de Setembro às 14:00 - Lançamento do livro e sessão de autógrafos no Auditório Sul da Feira (link)

Feira do Livro de Porto - Jardins do Palácio de Cristal
✒ 11 de Setembro às 18:30 - Apresentação do livro na Sala Multimédia da Biblioteca Municipal Almeida Garrett
(link)
11 de Setembro às 19:30
- Sessão de autógrafos no pavilhão da Convergência (bancas 88-89) 

Imagem: Edições Trebaruna

Confesso que tudo isto continua a ser algo enorme para mim mas estou a "digerir" tudo com serenidade. Estou, sobretudo, muito contente em participar novamente numa antologia com outros autores portugueses. 💚

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Índice da antologia Sangue

Matadouro - Liliana Duarte Pereira
Anfitrite - Maria Varanda
O momento certo - Lívia Borges
Icor - Susana Silva
O homem perfeito - Catherine Neves
O osso da memória - A. M. Catarino
Só eu - Júlia Pinheiro
Os fumos - Sebastião N. Viana
Gabriela - Marta Nazaré
Equilíbrio - Sandra Henriques
Santa Maria, Mãe de Deus - Lídia Dias
O homem do comboio - Madalena Feliciano Santos
Uma noite de chuva - Pedro Lucas Martins
Sangue e cinzas - Patrícia Sá
Sob a névoa -
Vanessa Barroca dos Reis
A capoeira - Francisco Horta
 
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Podem adquirir o livro através dos sites da Trebaruna, da Bertrand e da Wook.

23 de agosto de 2022

Ring shout

  

Autor: P. Djèli Clark
Género: Ficção Especulativa

Idioma: Inglês

Páginas: 192

Editora: Tor.com (Kindle)

Ano: 2020

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Quando Ring shout me foi recomendado, não reconheci o nome do autor, P. Djèli Clark.

Mas quando vi a capa… a capa espectacular! e li a sinopse, não foi preciso mais nada para me convencer a comprá-lo.

O ano é 1920. O lugar é Macon, na Geórgia americana.

Uma força maligna ameaça dominar a América. Três jovens mulheres – Maryse, Sadie e Cordelia – não têm mãos a medir, entre o contrabando de whisky em plena Lei Seca, e a luta contra os "ku kluxes", criaturas sanguinárias que semeiam a destruição à sua passagem.

Todos os membros do Ku Klux Klan (KKK), devido à quantidade de ódio e intolerância em si, possuem o potencial para se transformar em "ku kluxes". De onde vem esta magia negra?

Vem da premissa (bastante original!) de que realizador D.W. Griffith é um bruxo e o seu filme O nascimento de uma nação - uma fita de 1915 de grande sucesso comercial que retrata os afro-americanos como irracionais e o KKK como uma força heróica -, é um feitiço que se alimenta da energia sombria da América, canalizando-a para os «homens-demónio em trajes brancos».

As forças que querem conquistar o mundo aproveitam-se do facto de o KKK estar no auge do seu poder e estatuto para se espalharem. E têm de ser derrotadas antes que dominem a nação.

Pessoalmente, achei a ideia muito interessante. A execução pelo autor foi impecável.

Ring shout, que aparece em algumas edições com o título alternativo Ring shout or Hunting ku kluxes in the end times, arrecadou os prémios  NebulaLocus e British Fantasy Awards quando saiu.

Apesar de ser uma história condensada em menos de duzentas páginas, há muita coisa a acontecer o tempo todo. A acção é rica e colorida, as personagens são complexas e o local é uma Macon alternativa cheia de pormenores e locais reais, misturados com mitos e ficção.

Apesar de Ring shout estar primeiramente classificado como terror, é um mix muito bem doseado de terror e fantasia urbana. Clark terá começado a esboçar a ideia para a história em 2015, baseando-se na diáspora africana, na cultura Gullah e no controverso filme de D.W. Griffith.

Há uns anos, eu costumava ler mais fantasia urbana (as séries de Sookie Stackhouse e de Mercy Thompson são aquelas que mais gostei e das quais guardo boas memórias) e foi muito bom revisitar o género.

Gostei bastante do trio de protagonistas, mulheres negras independentes, que se apoiam e entreajudam, numa relação de amizade sólida fortalecida por um inimigo comum. Adorei o uso do folclore local, assim como os pormenores sobrenaturais e de magia: os "night doctors", as "aunties", as mezinhas de Nana Jean.

A ideia das criaturas é genial: os "ku kluxes" vivem escondidos dentro de algumas pessoas, só sendo vistos por aqueles que possuem "a visão”. Quando mortos, transformam-se em cinza e desfazem-se sem deixar rasto. Juntando isto ao terror que o KKK espalhou durante os anos de actividade, é difícil pensar em algo mais terrível para a comunidade negra norte-americana.

P. Djèli Clark é o pseudónimo de Dexter Gabriel, um professor doutorado em História. Como autor, já recebeu inúmeros prémios e nomeações dentro da ficção especulativa.

O título Ring shout refere-se ao ritual religioso, praticado pela primeira vez por escravos africanos nas Índias Ocidentais e nos Estados Unidos, no qual os fiéis se movem em círculo enquanto arrastam os pés e batem palmas, por vezes gritando num semi-transe. Há uma forma mais moderna do ritual, a “pausa para louvar”, praticada em muitas igrejas negras e/ou pentecostais nos dias de hoje.

A leitura deste livro foi um prazer. Espero que seja traduzido em Portugal; no Brasil, foi publicado como Ring shout: grito de liberdade.

*****
(muito bom)

15 de agosto de 2022

Rugas

 

Autor: Paco Roca
Género: Banda desenhada
Idioma: Inglês
Páginas: 104
Editora: Levoir
Ano: 2022

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Rugas tem tudo para ser uma história tocante, os seus temas principais sendo a velhice, o abandono e a senilidade.

A ideia para a novela gráfica terá surgido quando Paco Roca, então um jovem ilustrador, desenhou um casal de idosos para uma campanha publicitária, e a agência retornou que os considerava antiestéticos e queria essa parte removida.

Paco Roca terá então decidido que a sua primeira novela gráfica teria pessoas de idade como figuras principais. Foi um dos primeiros ilustradores a fazê-lo, assim como a incluir a demência senil como tema principal numa novela gráfica.

Rugas foi publicada em 2007 em Espanha, seguindo-se a edição francesa. Ganhou o Prémio Nacional do Comic e o Gran Guinigi Festival Lucca em 2008, e ainda o Excellence Award Japan Media Art Festival em 2012. Outras traduções se seguiram.

Em 2011, foi adaptado ao cinema animado, arrecadando dois prémios Goya - melhor filme de animação e melhor argumento adaptado.

Fonte: google images

Vamos à história, que começa com Emílio, um ex-bancário de 72 anos, a dar entrada num lar após alguns episódios ligados à doença de Alzheimer. Conhecemos o seu colega de quarto na residência, Miguel, espevitado e de uma honestidade duvidosa.

É com Miguel que Emílio faz a primeira volta pelo edifício, conhecendo os outros residentes e começando a participar das actividades diárias. Há um andar à parte no lar, para onde os casos extremos de demência são transferidos – uma hipótese que assusta Emílio.

Fonte: google images

A forma como a(s) memória(s) é retratada em Rugas é excelente. Há momentos comoventes e há humor negro. Há acontecimentos recentes que se "perdem", pormenores engraçados e peculiares dos utentes do lar e ainda mais humor. Vemos várias vinhetas quase idênticas, com salas cheias de idosos adormecidos, onde só varia a hora no relógio, reflectindo a monotonia que se vive no espaço.

Há vinhetas onde um jogo de bingo e uma sessão de “desporto” se transformam num quadro pitoresco, devido à surdez e demência dos idosos presentes.

Há uma tentativa de fuga num carro desportivo. Há medicamentos a horas certas. Há amizade e companheirismo. Há morte.
 
Fonte: google images

Mais do que ser "apenas" um bom livro com uma história muito bem explorada, Rugas serve para sensibilizar para alguns dos efeitos da velhice e para combater os estereótipos relacionados com ela, alertando para o abandono e solidão dos mais velhos.

Fechamos o livro com o coração cheio de empatia e carinho pelos nossos mais velhos. E como o meu avô paterno também sofreu da doença de Alzheimer antes de falecer, fiz e acabei a leitura em lágrimas.

*****
(muito bom)

10 de agosto de 2022

Something is killing the children #1

 

Autores: James Tynion IV,
Werther Dell'Edera, Miquel Muerto
Género: Banda desenhada
Idioma: Inglês
Páginas: 128
Editora: BOOM! Studios
Ano: 2020

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Something is killing the children #1 é o primeiro de uma série de cinco livros, quatro já editados.

Este volume inicial não perde tempo a entrar na acção. Archer's Peak é uma cidade pequena,  atormentada pelo desaparecimento de várias crianças. Fala-se de criaturas terríveis que vivem nas sombras, mas são mitos em que quase nenhum adulto acredita.

Por isso, quando James, o único sobrevivente de um ataque no bosque, começa a contar do que se lembra, ninguém acredita a não ser uma estranha mulher que chegou recentemente à cidade. Erica Slaughter é o seu nome e não tem tempo a perder: está ali para matar monstros.

Fonte: doomrocket.com

Neste primeiro livro, percebemos que há uma organização da qual Erica faz parte, um grupo que "lida" com o sobrenatural. A sua formação e estrutura serão desenvolvidas no próximo volume, certamente. Há muitas opções onde esta, e outros pormenores da história, poderão desaguar.

Gostei muito da atmosfera de Something is killing the children #1, das ilustrações e do tom. As personagens são bem desenvolvidas e vemos como a vida se passa na cidade de Archer's Peak, algo que ajuda a entrarmos na história. A heroína, Erica Slaughter, é uma figura forte e carismática, que dá gosto seguir.


Fonte: doomrocket.com

Sendo uma história de terror com elementos slasher, há violência e linguagem gráficas. Sendo as crianças o alvo principal, fica o aviso a quem não queira ler uma BD com estas características.
 
No final deste 1.º volume, podemos ver as capas alternativas, todas excelentes. A série tem acumulado prémios, tanto a nível artístico como de argumento. Reconheci em algumas vinhetas o traço de manga, que não aprecio, mas felizmente aparece pouco. Dell'Edera, o ilustrador, e Muerto, o colorista, são muitos forte no gore e em dar um aspecto tenebroso às cenas intensas. 5 estrelas!
 
Fonte: doomrocket.com

Tenho os quatro livros que saíram e conto ler a série completa.

Enquanto procurava por notícias do quinto (e último) volume, li que esta série de BD estará a ser adaptada para televisão pela Netflix, com Mike Flanagan alegadamente envolvido na produção - a ser verdade, estou bastante curiosa em ver o resultado
.

Para já, vou continuar a ler os livros restantes; segue-se Something is killing the children #2.

*****
(muito bom)

7 de agosto de 2022

O adeus a Jô Soares aos 84 anos






No passado dia 5 de Agosto, morreu o talentoso Jô Soares, baptizado José Eugénio Soares.
 
Jô Soares nasceu no Rio de Janeiro em 1938, o único filho de um casal abastado. Estudou na Suíça e nos Estados Unidos até aos 18 anos, falava seis línguas e abandonou o plano de ser diplomata para se dedicar à vida artística.
 
E foi no mundo das artes que se consagrou; foi humorista, actor, realizador, produtor, artista plástico, apresentador de televisão e escritor.

Foto: br.yahoo.com

O humor era a sua marca registrada. Foi o seu ponto de partida e assinatura no teatro, na televisão, no cinema, nas artes plásticas e na literatura.

Interpretou dezenas de personagens, criou bordões que atravessaram gerações e entraram na linguagem do dia-a-dia, e apresentou o programa de entrevistas mais famoso do Brasil durante 16 anos, o "Programa do Jô"
.

Na sua carreira, Jô Soares realizou mais de 14 mil entrevistas, representou mais de 200 personagens humorísticas, dirigiu mais de 20 peças de teatro e escreveu oito livros. Conheço o seu trabalho hilariante como humorista e apresentador; tenho um gostinho especial pelos seus romances. Dos oito livros que Jô Soares escreveu, quatro são romances: O xangô de Baker Street (1995), o meu preferido dele, um bestseller adaptado ao cinema em 2001; O homem que matou Getúlio Vargas (1998), Assassinatos na Academia Brasileira de Letras (2005), e As esganadas (2011).

Nos seus livros, para mim, uma das partes mais deliciosas é ler a perspicácia e o tom de sátira com que caracteriza pessoas e espaços, e é visível o amor às Artes e à História, em várias referências que atravessam séculos e continentes. Foi condecorado com vários títulos pela sua contribuição para as Artes; desde 2016 que era membro da Academia Paulista de Letras.

«O medo da morte é um sentimento inútil: você vai morrer mesmo, não adianta ficar com medo. Eu tenho medo de não ser produtivo. Citando meu amigo Chico Anysio, [uma vez] perguntaram para ele: "Você tem medo de morrer?". Ele falou: "Não. Eu tenho pena". Impecável.» (Jô Soares)

Fontes:
Wikipedia, Globo e Academia Paulista de Letras.
 
Foto: br.yahoo.com

2 de agosto de 2022

As esganadas

  

Autor: Jô Soares
Género: Policial

Idioma: Português (Brasil)

Páginas: 264

Editora: Companhia das Letras

Ano: 2011

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Jô Soares é mais conhecido pelas suas prestações como humorista e apresentador de televisão. Multifacetado, é ainda actor, dramaturgo, músico... e um escritor de mão cheia.
 
Dele, ainda hoje me lembro do excelente O xangô de Baker Street, onde Sherlock Holmes e Dr. Watson são convidados a investigar um caso no Brasil, um livro que originou uma boa adaptação cinematográfica, com Joaquim d'Almeida, João d'Ávila e Maria de Medeiros.

Em As esganadas, reencontro a escrita fluída e erudita, com notas de humor certeiras, de Jô Soares. O tom é semelhante ao primeiro título que li dele [O xangô...], que continua o meu favorito.

A acção passa-se no Rio de Janeiro, em 1938, durante o governo [Estado Novo] de Getúlio Vargas. É um livro do género policial, onde a identidade e motivações do assassino - de nome Caronte (adoro!) - são reveladas nos capítulos iniciais, e continuam a ser desenvolvidas ao longo do livro, com vários pormenores grotescos e  caricatos, uma técnica em que Jô Soares é mestre.

Há uma leveza desarmante para caracterizar as mortes aterradoras das "esganadas", mulheres bonitas e obesas que morrem «entupidas» com doces/sobremesas portuguesas que o assassino prepara de raiz. Apesar do grafismo de várias passagens, a leitura faz-se quase sempre com um sorriso nos lábios. Jô Soares percebe de entretenimento em todos os formatos!  

Pelo meio de uma narrativa onde as coisas não páram de acontecer, o delegado Mello Noronha, responsável pela investigação, emprega o roliço ex-inspector português Tobias Esteves - afastado da polícia portuguesa por ter estado envolvido num episódio com Fernando Pessoa e Aleister Crowley na Boca do Inferno - como consultor. Esteves abriu um negócio no Brasil, de doces e salgados tradicionais portugueses; é uma personagem com tiradas muito engraçadas.

Na acção, aparecem muitas outras personagens coloridas, fictícias (o anão Rodapé, a jornalista Diana de Souza, o inspector Valdir Calixto) e reais (Vasco Santana, Mirita Casimiro, Fernando Pessoa, Lourival Fontes, Filinto Müller).

«Mais vale ser solteirona em Sintra do que apedrajada em Teerã.»
«Diariamente, a mulher gorda morre uma série de pequenas mortes.»
«- O senhor não é gordo, é só um pouco baixo pro seu peso.» 
As esganadas foi publicado em Portugal pela Editorial Presença. Eu preferi ler o texto no original, em Português do Brasil, e tirando alguns termos em calão, acessíveis no contexto, a leitura foi bastante fluída.
 
Os dois livros que li, à data, de Jô Soares estão aprovadíssimos e são mais do que recomendados. 

*****
(muito bom)